O Brasil voltou a crescer no primeiro trimestre deste ano, mas a população ainda sente os sinais da crise econômica. Ao fim da pior recessão já registrada no país, mais de 14 milhões de brasileiros continuam desempregados. A recuperação da economia é lenta e a retomada das contratações é um dos últimos passos.
O G1 foi às ruas do Centro de São Paulo ouvir os consumidores sobre suas percepções em relação à economia e expectativas para o futuro. Os relatos mostram que grande parte dos brasileiros ainda sente a crise e segura gastos, mas tem esperança que a situação melhore (veja todos os relatos no fim do texto).
A publicitária Luciana Palla, 34 anos, não sentiu a recuperação da economia. “Eu acredito que ainda não deu para perceber nenhuma melhora, espero que até o final do ano a gente consiga sentir esse otimismo. Eu fui mandada embora em fevereiro deste ano e estou procurando emprego”, disse.
Já a vendedora Karol Santos, 19 anos, percebeu uma recuperação no comércio, mas diz que as vendas ainda estão fracas. “No começo do ano, as vendas estavam péssimas. Agora está dando uma melhorada. Mas o pessoal ainda está preferindo levar sempre uma peça apenas, menos quantidade. Os consumidores estão bem acanhados, com medo de comprar”.
Recuperação vem do campo
Um dos motivos pelo qual os brasileiros das grandes cidades não sentem a recuperação da economia é que o crescimento do primeiro trimestre foi puxado pelo agronegócio, como comenta o economista Nelson Marconi, professor da PUC e da FGV.
“O setor que estava crescendo mesmo é o agronegócio. Como ele corresponde a uma parte importante do PIB, isso gera um impacto positivo, mas afetando muito mais as cidades do interior, onde aumentou a venda de produtos agrícolas. As pessoas dos centros urbanos não sentem isso, e é a maioria da população”, diz Marconi.
Para que o crescimento da economia faça diferença para as pessoas, a recuperação deve ser estrutural, dizem os economistas. Isso depende de uma série de fatores, como o restabelecimento da credibilidade econômica e política do país. Para o consultor financeiro Miguel Daoud, o Brasil ainda não deu o primeiro passo para voltar a crescer.
“Essas pontes precisam ser construídas de forma sólida. Não basta vontade para transpor o abismo”, compara Daoud.
O economista aponta a instabilidade política como uma das principais dificuldades para a retomada do crescimento sustentável. “O primeiro passo que o Brasil tem que dar para sair da recessão é reestabelecer a credibilidade política, e ela está muito ruim. A credibilidade traz a confiança dos investidores e dos consumidores, faz com que ocorram investimentos, o que diminui o estoque de desempregados. Isso não está acontecendo. ”
Etapas da recuperação
A recuperação da economia é uma reação em cadeia, explicam os economistas Otto Nogami, professor do Insper, e Nelson Marconi, da PUC e da FGV. De acordo com os especialistas, o primeiro passo para um país voltar a crescer é a organização das contas públicas. Isso porque, só com as contas em ordem, os investimentos públicos podem voltar a ganhar força, puxando o PIB para cima.
Com as contas públicas em dia, a confiança dos empresários também se recupera, já que, prevendo que a economia vá crescer, as empresas buscam elevar sua produção.
“Os investimentos mexem com toda a estrutura produtiva do país. Ao mexer nessa estrutura, inevitavelmente tem início a geração de empregos”, aponta Nogami.
A retomada do emprego é essencial para o passo seguinte da recuperação – a confiança dos consumidores. As famílias mais confiantes voltam a gastar e o consumo aumenta. “O investimento gera emprego e faz com que a confiança da população aumente. A sociedade volta a consumir, e então a economia começa a girar de novo”, diz Nogami.
Pessimismo persiste
Os dados da Fundação Getúlio Vargas (FGV) e do Instituto Brasileiro de Economia (IBRE) mostram que os índices de confiança do consumidor estão melhores em 2017 na comparação com o ano anterior, mas seguem abaixo do patamar considerado “neutro”, de 100 pontos (veja no gráfico abaixo). Isso significa que eles ainda estão pessimistas com a economia brasileira.
Veja como oito brasileiros encaram a situação econômica do Brasil
Tiago Brito da Silva, 25 anos, ajudante geral, desempregado
“A minha situação está crítica no momento. Tenho filho para criar, conta para pagar. Estou procurando trabalho na área de ajudante geral. Já trabalhei como ajudante de pedreiro, ajudante de lava rápido, estacionamento. Mas nada fixo, nenhum serviço digno com registro na carteira. Só uma única vez que fui registrado, em 2011. Desde aquele ano estou fazendo bico, me virando como posso. Mas estou parado totalmente já faz uns 5 meses. Desde quando meu filho nasceu, não arrumei mais trabalho nenhum. Eu creio em Deus que vai melhorar, mas acho que vai demorar um pouco. ”
Maria Brito, 49 anos, professora
“Eu não vejo melhora nenhuma na economia, pelo contrário. Eu vejo assim que tem uma oscilação muito grande. Na bolsa a gente vê a instabilidade, principalmente agora com os últimos acontecimentos. E a gente que vai no supermercado e sente isso, que não está nada fácil, cada dia tem um aumento de alguma coisa. Eu sou professora do Estado, não temos aumento há um bom tempo. O salário não está acompanhando. Com certeza, eu gasto muito mais com menos coisas do que eu comprava antes. Mas, olha, eu sou brasileira. Brasileiro sempre tem esperança. Então vamos orar para que a política se estabilize, para que a economia ande. Eu tenho certeza de que vamos melhorar. ”
Flavio Luiz Gonçalves Fernandes, 76 anos, aposentado
“Está melhorando sim, estou otimista. Tenho na família pessoas desempregadas e elas estão já vendo uma luz no fim do túnel. Estão mandando currículos e são chamados para entrevista. Já é alguma coisa. O duro é quando não tem nem entrevista. Eu tenho um filho engenheiro químico, formado na FEI, fala três idiomas e não arruma emprego. Até o ano passado, ele trabalhou até outubro. Depois, a firma diminuiu o volume, foi obrigada a fazer um corte e ele estava incluído nisso. ”
Wallace Silveira, 39 anos, designer
“Eu senti uma melhora em termos de valores dos produtos no supermercado. Teve alguma redução, já é um começo. Mas acho que precisa ter o otimismo da galera também, né? Todo mundo precisa ficar mais confiante para a economia começar a girar. Estou trabalhando de casa, como autônomo. Está começando a prosperar alguma coisa, mas ainda longe do ideal. É uma situação de ‘semidesemprego’, vamos dizer assim. Mas estou otimista. Esse caso do Temer deu uma desanimada, mas a esperança é que melhore mesmo. Estou otimista. ”
Luciana Fagundes Palla, 34 anos, publicitária
“Eu acredito que ainda não deu para perceber nenhuma melhora, espero que até o final do ano a gente consiga sentir esse otimismo. Eu fui mandada embora em fevereiro deste ano, estou procurando emprego. Mas, enquanto isso, comecei a fazer um empreendedorismo por conta própria. Vamos ver se dá certo, para aí nem precisar mais voltar para o mercado de trabalho. Mas enfim, não vejo ainda [a economia] com uma visão otimista. ”
Karol Santos, 19 anos, vendedora
“No começo do ano, as vendas estavam bem ruins, estavam péssimas. Agora está dando uma melhorada, mas o pessoal ainda está preferindo levar sempre uma peça apenas, menos quantidade, estão equilibrando bastante. Os consumidores estão bem acanhados, com medo de comprar. Estamos esperando a melhoria. O começo do ano passado também foi bem baixo. Eu acho que, neste ano, eu ainda consegui vender mais. ”
Cleini Teixeira da Silva, 42 anos, vendedora
“Nós temos bastante cliente antigo na loja. Só que agora eles não estão comprando como eles compravam antigamente. Nós vendíamos muito atacado. Agora não, eles escolhem as peças e é só aquilo, acabou. Tanto que nós estamos trabalhando sábado e domingo para cobrir os desfalques. Eu vou falar a verdade, porque eu trabalho já há 28 anos no comércio: eu nunca vi uma situação dessa. Mas estamos aí, firmes e fortes. ”
Fabiano de Oliveira Guedes, 38 anos, subgerente de loja
“No começo do ano, as vendas foram bem difíceis. Os consumidores estão com medo de fazer dívida, de gastar. O que a gente percebe é isso. A crise pegou. Tenho amigos que ficaram desempregados e não conseguiram emprego até hoje. Mas a gente tem esperança de melhorar. Ainda mais a gente que trabalha no comércio. A gente sempre espera melhorar. ”